domingo, 11 de julho de 2010

O Ritual do café por Ilona Bastos

Estampa-se o sol em delicados raios
Sobre o mármore branco e liso da cozinha.

Suavemente me debruço e uma porta abro,
Recolho a chávena fina e o florido prato.

Ergo o meu braço e num voo livre,
No gesto de um armário desvendar,
Recolho o nobre pó de inebriante aroma.

Alongo a mão que a gaveta encontra,
E dela escolho, enfim, a colher mais bela,
Brilhante, pequena, com terno recorte.

Tudo coloco em ordem e harmonia:
O prato tranquilo e a expectante chávena,
Nesta, o torrado grão moído, de castanho intenso.

No açúcar rico, centro o meu cuidado,
A montanha branca transportando, pura,
Em bojuda prata que doce se inclina.

E luzem cristais em cascata linda!
Depois, a água borbulhante, quente,
A mistura inunda, dissolvendo-a

Em espirais de espuma que a colher adorna.
Café! Café! Precioso encanto!
Em dégagé devant te cumprimento,

Os meus braços lanço em acolhimento grato.
Da janela aberta me acerco então.
Tão bela é a vista que o Outono pinta no jardim!

Castanho da terra e verde das plantas unem-se
À água que brilha em bebedouro antigo.
Aspiro, feliz, da manhã tranquila, o seu odor

A quente café e à relva orvalhada.
Olho o céu e sorvo um gole, outro e outro.
E assim me quedo, por instantes longos.
Entre o prazer forte do café e a doçura da manhã
Mais um dia de vida se inicia!


Lisboa, 24 de Outubro de 2004

Nenhum comentário:

Postar um comentário