domingo, 8 de maio de 2011

O Chapéu





Escolhi o vestido, marrom de poá creme, tubinho, vesti as meias de seda chocolate, sapatos marrons e uma valise creme já em sépia devido ao uso contínuo.
Certamente irei de chapéu.
Minha personalidade marcante pede que eu deva ofuscar alguns candidatos e manter os holofotes sobre mim.
Desci o velho elevador, fechando a grade como quem vira uma página, ouvi a discussão dos Andrade, num bate-boca violento, com xingamentos e gritarias que não me fizeram chamar os macacos por serem comuns demais os arroubos intempestivos daquele casal! Acabaria em barulhos noturnos com vozes aindas mais altas denunciando o que faziam.
A pilha de processos que eu carregava, fazia em meus braços vergões. O quê aos incautos pareceriam chibatadas me faziam pensar...como eu deveria aparecer no gabinete do Desembargador Eurípedes exausta e em pleno exercício mental para convencer-lhe o espírito???
Cheguei ao estacionamento pronta para abrir a porta do carro e...onde estava as chaves? Não, eu não podia ter esquecido das chaves...meu Deus, como alguém que tem um compromisso inadiável, esquece de pegar as malditas chaves do carro? Assim,...esquecendo, em cima da mureta, que separa o hall do elevador das escadarias...Voltei para buscar as chaves, aproveitei para deixar os processos na portaria pois iria subir somente por alguns instantes.
Voltei ao meu andar e lá estavam elas...a me esperar. Girei sobre os calcanhares e desci no mesmo elevador. Novamente fechei a grade e adorei pensar no charme nostálgico de um elevador com uma grade corrediça.
Muitos prédios no Centro ainda têm este tipo de elevador. São Paulo é sempre o passado de mãos dadas como futuro...Como gostei de vir para cá. Meus pais,  percorreram um longo caminho de Portugal até aqui ...
Novamente passando pela portaria, retirei meus pesados processos, para então ir ter com o Poderoso Desembargador. De lá mesmo, voltaria ao escritório para uma tarde cheia de trabalho e de leitura, ... Dois volumes com mais ou menos quinhentas páginas cada um.
Novamente o Desembargador povoa meus pensamentos ... por onde começar? O quê falar? O quê não dizer?
Abri a porta do carro e despenquei a pilha de papel por sobre os bancos do passageiro quando dei por conta de um envelope no banco traseiro. Engraçado, não me lembro de ter deixado nada sobre o banco e logo peguei o que mais parecia ser uma correspondência.
No envelope, meu nome escrito em letras caligráficas...um Convite:  Quando abri, pude perceber que ele havia sido jogado pelo vidro do carro entreaberto. Era o convite do casamento da Eleonora do 76. Casamentos são festas tão íntimas! Parentes e amigos próximos!!! Tá bom demais da conta...vizinho...nem por educação!!! Não vou., apesar do requinte do convite recomedar  a festa. Cansei de festas.
Ao sair, aquela espiada básica no retrovisor, conferindo olhos, dentes, batom e o chapéu...ri porque pensei tô com tudo em cima!
A oração colada no painel, a Armadura de Deus, Efésios, 6, alimenta o espírito e o investe de poder para mais uma batalha. Agora sim, são 6: 47 no relógio. Saio da zona Sul para chegar ao Centro. Em duas horas estarei sentada no Chalita, tomando meu café com pão francês. sentei na " minha' mesa e de lá, só com o acenar das mãos , o próprio, já fez o meu pedido. os jornais me foram entregues para uma olhada!
A inflação alarmante, a violência, os espetáculos, fui assim, lendo apressadamente na ordem estabelecida por alguma rotina que invariavelmente se desenrolava, até que parei os olhos na manchete. A grande construtora dava o calote mais escandaloso que já se ouviu falar em clientes de todo o país!
Mais casos e mais casos e mais casos, que enchem os bolsos dos advogados de dinheiro, e o saco dos cidadãos de bem e de bens !
O Direito valendo-se dos códigos para dominar os instintos de alguns...


Ficou com vontade de ler mais?
responda.
Obrigada.


Grace Teles


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